A Volkswagen dominava boa parte do mercado brasileiro de veículos de
passeio em meados da década de 1960, mantendo-se na liderança com o
Sedan, mais tarde batizado oficialmente como Fusca – apelido que virou
nome de batismo. A receita do Fusca já era mais do que premiada e bem
aceita pelos consumidores. A cada esquina havia uma Kombi, um Fusca, um
Karmann Ghia… Os produtos da VW ocupavam a paisagem de qualquer cidade
do Brasil, graças à boa fama gerada pela manutenção simples,
facilidade
de guiar e baixa desvalorização na hora da revenda.
Volkswagen Zé do Caixão 1975
Para tentar reduzir esse domínio alemão, a Willys-Overland, em
parceria com os projetistas da Renault, trabalhava em um novo projeto
para substituir o Gordini. Com a aquisição da Willys pela Ford, o
projeto foi aproveitado e deu origem a dois automóveis distintos:
Renault R12 e Ford Corcel, este último apresentado ao público no Salão
do Automóvel de 1968, no recém-inaugurado Palácio de Exposições do
Parque Anhembi, em São Paulo. O resultado era um carro que oferecia
mais
espaço para os passageiros, um porta-malas que acomodava a bagagem de
uma família tradicional e ainda tinha desempenho satisfatório e boa
economia de combustível – tudo isso a um preço bastante competitivo.
A Volkswagen então não poderia ficar para trás. Com as vendas do
Corcel lá em cima, a fabricante alemã contra-atacou e apresentou seu
primeiro automóvel quatro portas para o Brasil no final de 1968, o
1.600. Para disputar a categoria dos carros médios a VW trouxe da
Alemanha o ferramental de estamparia do protótipo EA97, desenvolvido até
a fase de pré-série sem que nunca tivesse entrado em produção na Europa.
Os engenheiros da filial brasileira trataram de trabalhar no
protótipo, agora com o nome B-135. Foi colocado para rodar pelas piores
estradas que se podia encontrar no Brasil, antes de ser aprovado.
Mudanças estéticas e estruturais resultaram em uma configuração nunca
antes oferecida pela Volkswagen: um automóvel com três volumes bem
definidos e quatro portas.
A carroceria trazia um desenho incomum para a gama da marca. Os
traços retilíneos acompanhados de faróis retangulares com indicador de
direção nas extremidades chamavam a atenção de quem estava acostumado
com as linhas arredondadas do Fusca. O interior era ainda mais
surpreendente, com bancos dianteiros mais confortáveis e um ajuste
preciso de regulagem do encosto que possibilitava ao motorista encontrar
a posição ideal para dirigir em pouco tempo.
Uma das características do 1.600 era a ampla área envidraçada,
praticamente livre de pontos cegos – principalmente na traseira devido
ao perfil mais baixo do terceiro volume. Os passageiros de trás também
encontravam muito mais espaço que no Fusca, com conforto para até três
ocupantes. Por fim, as portas de trás facilitavam o acesso, com abertura
suficiente e facilidade de manejo.
O sedã era equipado com propulsor de 1.600 cilindradas e carburador
Solex H30, motor desenvolvido a partir do tradicional 1.300 do Fusca com
algumas modificações que geraram 60 cv de potencia a 4.500 rpm. O torque
de 11,5 mkg estava disponível a partir dos 2.500 rpm, o que fazia do
1.600 um carro ágil sem que fosse necessário ficar esticando marchas
para que ele ganhasse velocidade.
Essa motorização deixava o modelo apto ao dia-a-dia dos grandes
centros urbanos e ainda garantia boa velocidade de cruzeiro nas
rodovias. Outro ponto positivo estava nos freios (disco na dianteira e
tambor na traseira), que se mostravam mais eficientes do que o sistema
do Fusca 1.300.
Só que as qualidades do 1.600 não foram suficientes para levá-lo ao
estrelato. E na época do lançamento ainda houve uma infeliz
coincidência. O cineasta José Mojica fazia imenso sucesso com seus
filmes de terror como “O estranho mundo de Zé do Caixão”, que
apresentava um sinistro personagem na busca incansável da mulher
perfeita, uma pessoa que tivesse inteligência acima da média para dar
origem a um filho com ele e continuar a procriar uma raça superior. Logo
o nome do personagem foi associado ao desenho do carro, que lembrava um
caixão pelas quatro maçanetas cromadas e pelo desenho da carroceria. Não
deu outra: o apelido pegou e ninguém mais lembrava do nome original do
carro…
Assim, as vendas do 1.600 estavam lá em baixo, e o pequeno número de
veículos vendidos em 1969 mostrou a dificuldade do público em associar o
carro à marca através das linhas, além do apelido que desencorajava
muitos possíveis compradores a adquirir o modelo. Por outro lado, as
vendas do rival Corcel estavam aquecidas.
Rejeitado pelos consumidores, o sedã foi encontrar refúgio entre os
taxistas cariocas. Na praça ele era boa opção para o trabalho, pois
oferecia mais conforto e a facilidade de acesso pelas quatro portas,
coisa que já era exigida pelos turistas estrangeiros. Então o 1600
passou a colher elogios dos proprietários pela agilidade e mecânica
confiável.
Em 1970 a Volkswagen encerrou a produção do 1.600 “Zé do Caixão”,
devido à queda abrupta nas vendas – no total foram produzidas apenas
24.475 unidades. A introdução das linhas quadradas do modelo deu origem
a dois produtos que traçaram um caminho de sucesso, a perua Variant e o
hatch TL, que chegou a ter uma variante com quatro portas. Mais tarde
chegaria a aclamada Brasília, um projeto inovador da Volkswagen
totalmente desenvolvido no Brasil para os brasileiros. |